Thursday, January 25, 2007

Sofro de um excesso de sensibilidade crônica. Não tem remédio, coquetel, nem tratamento experimental ou alternativo que dê conta disso. Qualquer coisa me transborda.


Presto atenção aos detalhes. Outras coisas simplesmente tropeçam em mim pedindo atenção.

Noite de aniversário de Sampa. Eu, caminhante, e a Avenida Paulista iluminada, esbanjando diversidade. Enquanto o ônibus ainda vai longe, capturo um Homem de (na) rua ajeitando-se pra dormir na soleira da porta de um Banco (as pessoas retirando dinheiro não o olham). Coloca os cobertores (aqueles cinzas com cara de Operação Inverno da Prefeitura), suas sacolas de plástico próxima aos pés, um embrulho faz as vezes de travesseiro. Ele se ajeita sob outro cobertor e abre o jornal. Faz um esforço danado e coloca-o próximo aos olhos. A iluminação do caixa eletrônico chega bem fraca a superfície do jornal. Antes de dormir naquela calçada, numa noite de verão, o Homem lê o jornal. Fico impressionada e olho ao redor. Ninguém mais o vê. Me sinto pequena. Fico curiosa imaginando quais palavras estão sob os olhos daquele Homem. E penso qual seria seu nome e sua história.


Fila do cinema. "Aqui é a fila pra Babel?" "É sim" "Obrigado" Duas senhoras param atrás conversando. Falam alto, entretidas. Quando a fila começa a andar, reclamam que o rapaz à minha frete "furou" fila. O rapaz vira-se e explica que ele já estava ali. Retrucam que não estava, que tinha saído e quis voltar para o mesmo lugar. Ele diz que não. Me incomodou a injustiça e eu intervi "senhora, ele já estava ali, eu mesma perguntei a ele se essa era a fila certa" E elas foram grosseiras comigo. E foram mais ainda com o rapaz, que ofereceu seu lugar a elas. Elas recusaram. Depois passaram à frente. Eu não consigo entender algumas coisas. Foi uma grosseria tão gratuita, dispensável, como todas as grosserias.


Luzes apagadas, o filme ainda não começou e ainda há pessoas entrando. Uma senhora reclama do rapaz que lhe deu passagem para as poltronas daquela fila. Ela resmunga alguma coisa. Ele retruca dizendo que só quis indicar o lugar. Eles trocam respostas ásperas e ela lhe manda um "cala a boca". O rapaz fica bastante irritado. A namorada intervém "se ela não tem educação, deixa pra lá".


Fico dolorida de presenciar esses diálogos. Preferia colher detalhes sorridentes, mas o caminho dessa noite era cheio de brutos.

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